quarta-feira, 4 de maio de 2011

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Lições de Boston

O que acontece quando o espaço destinado à mobilidade fica livre de barreiras?

Ruas e avenidas são normalmente reservadas à circulação de veículos, ficando os pedestres restritos a calçadas, e estas, muitas vezes, são estreitas e cheias de obstáculos. Porém, existem ocasiões especiais em que essas mesmas vias são interditadas aos veículos e se transformam em um grande espaço livre de barreiras.

Dentre os motivos que levam ao fechamento de uma via aos veículos automotores está a realização de eventos esportivos. Um grande exemplo são as maratonas que arrastam multidões em diversas cidades e países de todo o mundo.

A maratona de Boston foi criada em 1897, logo após a Olimpíada de Athenas e vem sendo realizada anualmente desde então. Em 21 de abril de 1975, a prova chegava à edição de número 79, e para delírio do público presente, o norteamericano Bill Rodgers cruzou a meta em primeiro lugar com o tempo de 2h09min55seg, o que também lhe rendeu o recorde nacional. Passados longos 48min05seg depois da chegada do vencedor da prova , o maratonista Bob Hall, outro norteamericano, cruzava a meta. A grande diferença é que ele havia completado todo o percurso em cima de sua cadeira de rodas, tendo sido o primeiro atleta a obter permissão do organizador da prova para fazê-lo oficialmente. Ao terminar a prova com o tempo de 2h58min00seg cumpriu, também, com sua promessa de completar o percurso abaixo de 3 horas, o que lhe rendeu um certificado oficial do feito.

Cinco anos depois, em 21 de abril de 1980, voltamos ao mesmo cenário e  Bill Rogers entra para a história novamente ao vencer, pela quarta e última vez em sua carreira, a maratona de Boston, com o tempo de 2h12min11seg, somando, também, quatro trunfos na maratona de Nova Iorque. Embora tenha vencido a prova, Bill Rodgers não foi o primeiro a chegar. Pela primeira vez, um cadeirante cumpria o percurso em um tempo inferior aos demais competidores, e este feito coube a Curt Brinkman, que terminou o percurso em 1h55min00seg, pulverizando o recorde mundial das maratonas em cadeira de rodas.

E a história não para por aí. Foi também na maratona de Boston, no ano de 2004, que o sulafricano Ernest Van Dyk completou o percurso em 1h18min27seg, quebrando o recorde mundial dos cadeirantes, marca não alcançada até a presente data. Por fim, há pouco mais de duas semanas, em 18 de abril de 2011 o queniano Geoffery Mutay quebrou o recorde mundial da maratona, cravando o tempo de 2h03min02seg (ainda que não tenha sido validado por conta da presença de vento favorável).


Quando a competição acaba, começa outra maratona, a da vida real. Os cadeirantes deixam de ter direito sobre o espaço livre de obstáculos destinado aos veículos automotores e voltam às calçadas. Décadas de avanços tecnológicos, que ajudaram a escrever uma história de conquistas no esporte, de pouco valem em um ambiente cheio de obstáculos, que pouco ou nada evoluiu neste período. Até quando?


2 comentários:

  1. A opção pelo carro e pelos ônibus levou os governantes brasileiros a ignorarem os pedestres e tudo o que a eles está relacionado. Assim como a fazerem "vista grossa" para a responsabilidade dos proprietários de imóveis, que deveriam cuidar de suas calçadas. Prova disso é a péssima qualidade da maioria das calçadas das cidades brasileiras: buracos, pouca largura, postes e, até mesmo, carros dificultando a passagem dos transeuntes. Aqueles que são responsáveis pelo planejamento e gestão do espaço urbano, deveriam experimentar a locomoção por cadeiras de rodas, muletas, carrinhos de bebê etc., a fim de verificarem a dificuldade encontrada pelos pedestres para andar pela cidade.

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